Dando sequência ao post da semana passada, agora vamos abordar a consequência do abscesso perianal quando a cicatrização completa não acontece: a fístula perianal.
Independentemente do tratamento que for realizado para cuidar da infecção e retirar o acúmulo de pus do abscesso, cerca de um terço dos pacientes experimentará a formação de uma ferida que não cicatriza, localizada ao redor do ânus.
Pronto, assim está formada a fístula perianal. Ou seja, a fístula é o nome dado ao trajeto inflamatório que faz uma comunicação entre o canal anal e a pele da região próxima ao ânus.
Como a fístula perianal afeta a vida?
Num quadro de fístula perianal, existe uma contaminação constante por resíduos fecais presentes no interior do reto, ou seja, há uma “batalha” entre os microrganismos e as células de defesa do indivíduo, o que gera a formação de pus e sangue.
Esse é o motivo pelo qual a principal queixa dos pacientes com fístula é a saída de secreção pela ferida da nádega e, claro, o fato de isso acabar sujando a roupa íntima.
Mas a fístula perianal é grave?
A fístula perianal raramente implicará em grande risco para a vida do paciente, mas essa doença causa limitações importantes e raramente cicatrizará espontaneamente. O quadro tem relação com as chamadas infecções de tratamento cirúrgico e, portanto, a escolha da melhor cirurgia fará toda a diferença.
Um fato crucial para ser levado em conta na abordagem dessas pessoas é que, infelizmente, o caminho da fístula não é retilíneo e varia em cada caso. Em outras palavras, esse é um problema que o cirurgião especializado deve sempre pensar e, por isso, precisa analisar cada paciente de maneira individualizada.
A anatomia da região pélvica é bastante complexa, com músculos responsáveis pela sustentação dos órgãos e manutenção da continência fecal – isto é, manter o controle das fezes. Por isso, é importante que o médico coloproctologista lembre desses músculos quando for planejar o tratamento, uma vez que qualquer dano à função muscular, poderá ter consequências na qualidade de vida do paciente.
Tratamentos para fístulas perianais
Os primeiros tratamentos que foram realizados para cicatrização das fístulas perianais se voltaram para o seguinte fato: se o trajeto ocupado pelas fístulas fosse aberto cirurgicamente e, então, limpo, isso permitiria a cicatrização natural do local.
Se pensarmos apenas na taxa de cicatrização, essa premissa é verdadeira – em outras palavras, quando o médico realiza a incisão e a exposição do caminho da fístula, é possível chegar a mais de 90% de taxa de cicatrização pós-operatória.
Mas há um porém nessa situação toda. Se o percurso da inflamação atravessar as importantes estruturas musculares, infelizmente haverá prejuízo na capacidade de o paciente reter fezes.
Então, há solução para as fístulas?
Sim! Muitos estudos estão cada vez mais se concentrando nos esforços da coloproctologia para preservar da função evacuatória dos pacientes com fístula perianal. Por isso, hoje temos dezenas de técnicas cirúrgicas que permitem a abordagem segura desse problema.
O resultado é sempre igual?
Bem, sempre que a medicina oferece muitos tratamentos para uma mesma doença, devemos ter em mente que, com certeza, nenhum deles é perfeito.
Estudos recentes apontam que as técnicas conservadoras apresentam sucesso entre 20 e 80% na cicatrização definitiva. Esse resultado é significativamente menor do que a fistulotomia simples, um procedimento que consiste na abertura do trajeto.
De toda forma, abaixo listamos algumas opções de tratamento de fístulas perianais – ou anorretais –, com preservação muscular:
Laser;
Avanço de retalho musculo-mucoso e/ou anorretal;
LIFT – ligação interesfincteriana do trato fistuloso;
Cola biológica;
Plug de colágeno;
VAAFT – Ablação vídeo assistida do trato fistuloso;
Aplicação de células tronco;
Aplicação de nitrato de prata;
Seton ou cadarço de drenagem.
Algo que devemos observar é que, quando uma das técnicas listadas acima é aplicada, isso não impede que outra seja realizada, em caso de falha. Por outro lado, essa não é uma opção quando o musculo é seccionado, pois a reconstrução raramente consegue recuperar a função contrátil prévia, de maneira satisfatória.
Experiência do cirurgião é essencial
É fundamental reforçar que, quando o médico cirurgião conhece bastante, isto é, fica bem íntimo das terapias conservadoras, os resultados vão melhorando com o tempo e a taxa de cura aumenta significativamente.
De toda forma, seguindo o princípio de que primeiro é importante não causar dano, a escolha pela preservação da musculatura e da continência tem muitos benefícios, apesar de nem sempre estar associada a uma maior taxa de cicatrização em um único procedimento.
Coloproctologista deve orientar o paciente
Deve ser ressaltado que a fistulotomia tem seu papel entre as opções de tratamento e, em casos considerados simples e selecionados, pode ser utilizada com segurança e com ótimos resultados. Cabe ao médico conversar e explicar para o paciente como será feita a abordagem.
Em outras palavras, um cirurgião especialista em fístulas perianais tem muitas opções de tratamento cirúrgico e sua experiência permitirá a escolha mais adequada caso a caso.
Mas o mais importante é que a escolha deve sempre levar em conta a terapia menos agressiva e com melhor resultado na cicatrização e na preservação da função anal.
Grande abraço!