A proctopatia por radiação é uma afecção desencadeada pelo tratamento radioterápico dos cânceres pélvicos e antigamente era chamada de retite actínica. É um processo inflamatório do reto (retite) que perdura por anos, mesmo após o fim do tratamento com radiação dos pacientes. Era extremamente frequente, até 30% dos pacientes, nas décadas de 1980 e 1990, atualmente viu sua incidência cair significativamente para cerca de 1,5% dos casos, isto devido à melhora da tecnologia envolvida e maior conhecimento da sua gênese.
A Radioterapia é uma modalidade de tratamento para várias doenças oncológicas e na situação em discussão falamos das lesões que acometem a pelve, como os tumores de colo de útero, próstata, reto e canal anal. Ela pode ser utilizada como tratamento isolado ou combinado com quimioterapia, pré-operatório ou pós-operatório. A escolha é individualizada pelo tipo e estágio do câncer e pela condição clínica do paciente.
Quando o paciente apresenta a proctopatia, esta pode ser aguda, de início rápido e transitório, ou crônica, que inicia mais de três meses após o tratamento. Leia abaixo as principais características de cada uma delas:
Aguda – Início rápido, pode acometer de 50 a 100% dos pacientes, se manifesta com diarreia, dor e urgência evacuatória (vontade incontrolável de ir ao banheiro).
Crônica – início mais tardio, é menos comum (em torno de 2 a 20% dos pacientes) e os sintomas mais comuns são sangramento, mucorreia (saída de catarro junto com as fezes).
A diferenciação entre os dois tipos é muito importante pois, apesar de mais frequente, a forma aguda regride em algumas semanas após o término da radioterapia e mais facilmente abordada com o tratamento medicamentoso. Já a forma crônica pode perdurar com sintomas por muitos anos, às vezes durante toda a vida do paciente com impactos significativos na qualidade de vida.
Nas figuras 1 e 2, podemos observar as alterações típicas da proctopatia por radiação crônica, observadas durante uma colonoscopia, que são as teleangectasias (casos aberrantes, formados de maneira desorganizadas, algumas vezes com sangramento ativo). No caso da lesão aguda, encontramos mais frequentemente afinamento da mucosa, com sinais de inflamação microscópica no resultado das biópsias.
Figura 1 - imagem por colonoscopia de áreas afetadas pela radiação no reto
Fonte - arquivo próprio - proibida a reprodução
Figura 2 - imagem por colonoscopia de telangiectasias (vasos aberrantes)
Fonte - Dr. Breno Nogueira - proibida a reprodução
Como toda doença relacionada aos métodos terapêuticos, a melhor forma de abordá-la é a prevenção. A utilização de aparelhagem moderna de radioterapia, posicionamento cuidadoso do paciente e utilização de radioprotetores podem auxiliar na mitigação da evolução para este quadro clínico catastrófico.
O diagnóstico da doença será feito por médico especialista (em sua maioria o coloproctologista) com a obtenção de história clínica detalhada da doença e do tratamento, exame físico e proctológico e, posteriormente a colonoscopia que será diagnóstica e em alguns casos, terapêutica.
A partir do diagnóstico, o tratamento será indicado de acordo com a gravidade dos sintomas dos pacientes e em sua maioria abordará o sangramento, que é a queixa mais comum. A aplicação de agentes tópicos como a formalina e enemas de sucralfato ou associações de antibióticos orais com enemas de água ou corticoides, podem ser efetivos em casos mais leves ou como medida inicial. A figura 3 mostra a imagem de um sangramento associado à proctopatia.
Figura 3 - sangramento retal
Fonte - Dr. Rodrigo Paiva - proibida a reprodução
A utilização de medicina hiperbárica também pode ajudar como tratamento combinado ou terapia isolada, todavia devem ser considerados os custos e disponibilidade do método.
Os tratamentos endoscópicos têm a vantagem de terem altas taxas de sucesso e benefício por períodos longos, mas os riscos, apesar de baixos, envolvidos nos procedimentos devem ser levados em conta no momento de orientação dos pacientes. As modalidades disponíveis são o plasma de argônio (padrão-ouro), cauterização mono e bipolar e o laser. As Figuras 4, 5, 6 e 7 exemplificam o tratamento por cauterização monopolar em seus passos pré, per e pós-tratamento imediato e tardio.
Figura 4 - imagem por colonoscopia de áreas afetadas pela radiação no reto
Fonte - arquivo próprio - proibida a reprodução
Figura 5 - cauterização endoscópica das lesões
Fonte - arquivo próprio - proibida a reprodução
Figura 6 - Aspecto final após a cauterização
Fonte - arquivo próprio - proibida a reprodução
Figura 7 - Aspecto tardio após tratamento com cauterização (este é um paciente diferente que foi submetido ao tratamento a título de exemplificação)
Fonte - arquivo próprio - proibida a reprodução
Por fim, nos casos em que não há resposta e a doença está causando grave prejuízo para o paciente, faz-se necessário o tratamento cirúrgico, que pode envolver a confecção de colostomia para desvio do trânsito de fezes e com isto diminuir os sintomas e a cirurgia de ressecção da área afetada com remoção de parte ou a totalidade do reto, que é bastante agressiva e sempre evitada.
Abraço e até semana que vem!